Língua portuguesa junta escritores de renome

Língua portuguesa junta escritores de renome

O auditório da Feira do Livro de Lisboa (Portugal) foi o palco escolhido pela UCCLA (União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa) para, no dia 24 de maio, juntar os escritores Pepetela, de Angola, Germano Almeida, de Cabo Verde, e Luís Carlos Patraquim, de Moçambique, numa conversa à volta dos desafios da Língua Portuguesa como veículo das diferentes culturas e sensibilidades num mundo - no âmbito dos “Encontros UCCLA com as literaturas Lusófonas”.
 

Encontros UCCLA com as Literaturas Lusofonas_Feira do Livro de Lisboa  Encontros UCCLA com as Literaturas Lusofonas_Feira do Livro de Lisboa  Encontros UCCLA com as Literaturas Lusofonas_Feira do Livro de Lisboa  Encontros UCCLA com as Literaturas Lusofonas_Feira do Livro de Lisboa


O Secretário-Geral da UCCLA, Vítor Ramalho, abriu a sessão, congratulando-se por poder contar, neste seu primeiro ato público, com a presença de três importantes vultos da literatura que usa a “nossa fala comum”, a unidade, a língua portuguesa. Referindo-se a Pepetela, Vitor Ramalho considera-o como um homem da geração da “utopia”, onde se forjaram grandes homens de Cultura. Germano de Almeida representa uma personalidade incontornável da fala comum, dando como exemplo a obra “O testamento do Sr. Napumoceno da Silva Araújo” que transmite a “plasticidade do nosso mundo”. No que respeita a Luís Patraquim é “sobretudo um poeta” que desempenha um papel importante na democratização dos povos.
 
De seguida, o coordenador cultural da UCCLA, Rui Lourido, fez uma breve apresentação de cada um dos escritores convidados.

A primeira intervenção coube a Pepetela, que referiu a possibilidade de utilização de outras línguas africanas, como o crioulo em Cabo Verde, acrescentando que a escolha do português em Angola se deve a uma clara influência urbana. O estímulo ao desenvolvimento de línguas de origem africanas, referiu não ter acontecido na prática. Para o escritor angolano, o português é a porta para o mundo e um instrumento de facilitação da Nação, mas não é o único, nem o mais importante, fator de ligação entre os países que falam português.

Para Germano Almeida, Cabo Verde tem uma língua, o crioulo, e a vida dos cabo-verdianos decorre em crioulo. O país não é bilingue, comentou, mas se o fosse, todos poderiam beneficiar desse fato. “O crioulo e o português são duas línguas que me pertencem”, argumentou. Sublinhando que poucas pessoas nas ilhas sabem ler a língua cabo-verdiana, Germano Almeida confessou que praticamente só fala em português, não dominando o crioulo no modo escrito. Por fim, afirmou estar convencido que a oficialização do crioulo afastará Cabo Verde do resto do mundo. Mas, acrescentou, “se há coisa oficial é o crioulo”.

Luís Carlos Patraquim, a propósito do receio do desaparecimento da língua portuguesa num país como Moçambique, cercado por países com línguas diferentes, afirmou: “As línguas não se decretam”. A língua portuguesa “é nacional, curricular, oficial e dá-nos a possibilidade de nos reinventarmos como moçambicanos".
Falando sobre a experiência de um escritor moçambicano, que escreveu dois livros em XiRonga e foi por isso acusado de tribalismo, Patraquim considerou que “não existe acto mais erótico do que a criação de um bom neologismo", manifestando, na sua intervenção, alguns sinais de “desobediência” ao padrão da língua portuguesa através da criação de fórmulas vocabulares inspiradas na língua oral.

Questionados sobre o acordo ortográfico, os três escritores optaram por não dar grande relevo ao assunto, afirmando que continuavam a escrever da forma como tinham aprendido a fazê-lo.

Sobre a lusofonia, o escritor Pepetela afirmou, de forma telegráfica, “Lusofonia, não gosto, nem uso”, acrescentando que “a língua dos lusos não a conheço. Francofonia é um projeto neo-colonial. Experimentemos inventar outros termos como, por exemplo, “cepelépes”.

O Secretário-Geral da UCCLA encerrou o encontro, agradecendo aos três escritores com uma frase de Amílcar Cabral “tudo isto é assim, porque nós pensamos em português”.


Informação sobre os escritores:
 
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, na Literatura conhecido por Pepetela nasceu em Benguela, Angola, em 1941. Licenciado em Sociologia, foi professor na Universidade Agostinho Neto, em Luanda. A sua obra reflete sobre a história de Angola, abordando não só temas contemporâneos, como a luta de libertação, a diversidade étnica, a independência e a guerra civil, mas também a vida durante o período colonial. A série de romances policiais Jaime Bunda é uma crítica satírica de alguns aspetos da situação angolana atual. Em 1997, Pepetela foi galardoado com o Prémio Camões.


Germano Almeida nasceu na ilha da Boa Vista, em Cabo Verde, em 1945. É licenciado em Direito e pratica advocacia na ilha de São Vicente. Começou a escrever aos 16 anos, mas só aos 45 publicou o primeiro livro. Usa de forma magistral o humor e a sátira para denunciar os males que afetam a sociedade cabo-verdiana. Exemplo disso é o romance O Meu Poeta (1989), considerado o primeiro romance verdadeiramente nacional. "O Testamento do Sr. Napumoceno da Silva Araújo", 1991, já foi adaptado ao cinema e galardoado com diversos prémios. Germano Almeida está editado em onze países e traduzido em nove línguas.


Luís Carlos Patraquim nasceu em Maputo, Moçambique, em 1953. Poeta, dramaturgo e jornalista, Patraquim colabora igualmente em várias áreas da informação e da comunicação e do cinema. Tem uma abordagem complexa e profunda da poesia, em temas do passado, do presente e de sempre, sobre o amor, a mulher, o mar e o sonho. Empenhado nos valores da justiça social e do humanismo, retrata a história de Moçambique de forma crítica, metafórica e onírica. Luís Carlos Patraquim recebeu o Prémio Nacional de Poesia de Moçambique em 1995.

Publicado em 26-05-2013