Adolfo Maria apresentou “Angola - A Hora da Mudança” na UCCLA

Adolfo Maria apresentou “Angola - A Hora da Mudança” na UCCLA

Uma análise sociopolítica, histórica e cultural sobre África e Angola está na génese do livro de Adolfo Maria “Angola - A Hora da Mudança” que foi apresentado no dia 27 de março, no auditório da UCCLA.
 
O Secretário-Geral da UCCLA, Vitor Ramalho, abriu a sessão perante uma plateia de amigos, familiares, historiadores e personalidades ligadas a África. A mesa era composta, para além do autor Adolfo Maria, por Luís de Carvalho Rodrigues (prefaciador da obra), Manuel dos Santos (sociólogo), Eduardo Fernandes (economista), e o editor Fernando Mão de Ferro (Edições Colibri).
 
Lançamento do livro de Adolfo Maria
 
De acordo com Vitor Ramalho, é uma honra a UCCLA acolher o lançamento desta obra “por todas as razões. Pela obra em si que fala de um período de mudança em Angola e de que ele (Adolfo Maria), como homem experimentado em várias andanças do mundo e, sobretudo, em Angola tem conhecimentos de sobra e pode-nos dar um relato daquilo que sente relativamente à experiencia que teve e que continua a ter e à proximidade que tem com Angola. Por outro lado é também uma honra porque o Adolfo é um velhíssimo amigo meu, praticamente há mais de 40 anos, com quem privei praticamente diariamente quando do exílio dele aqui em Portugal, com outros amigos e através dele conheci também personalidades de referência em Angola”. 
 
“Dificilmente, se calhar, a gente encontra um exemplo tão forte como o Adolfo Maria e o facto de ele continuar aos 80 e qualquer coisa a escrever, a debruçar-se sobre o que acontece na sua terra, não guardando rancores de coisas que muitos, se calhar, guardariam ao longo de uma vida” confessa o editor Fernando Mão de Ferro
 
Enaltecendo a personalidade do autor, o editor acrescentou que “mesmo num passado, não muito distante, um passado recente, em que todos nós éramos tao críticos daquilo que se passava em Angola, ele mantinha uma calma extraordinária, não deixando de ser crítico e de analisar profundamente e de criticar profundamente as coisas também, mas nunca tomando uma posição radical, coisa que ele podia facilmente tomar e que, pela sua história, pelo seu passado lhe era, digamos assim, aceite”. 
 
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Para Luís Rodrigues prefaciar “Angola - A Hora da Mudança” foi uma reflexão sobre a escrita e o pensamento de Adolfo Maria, sublinhando quatro aspetos que o impressionam: a preocupação, sempre presente, do autor em “cuidar da dignificação do ser humano”; a segunda em que o livro nos “fala de mudanças que elevem a democracia, o mesmo é dizer, para ser mais simples, que permite a concretização dos direitos dos cidadãos que estão expressos na constituição de Angola”; em terceiro “e o Adolfo faz isso com muita mestria, é a respeitabilidade que deve ter a ação do Estado”; por último “é um livro escrito com pleno sentido humanista. O Adolfo fala-nos de uma Angola em que a política é para gente simples, que anda pelas ruas do Uíge, ou Sumbe, ou nas quitandas da rua, ou nas Sanzalas de Cabinda. Gente se levanta cedo para ir trabalhar, que vive e ama o seu rico folclore. Uma Angola onde não há abstração construída na cidade alta de Luanda, sabemos bem o que isso quer dizer.” 
 
Em suma é “um livro que fala da hora na mudança” acrescenta o prefaciador, um livro “que refere, com coragem, os vícios que conspurcaram o passado e os amplos caminhos que estão à frente. Muitos caminhos estão à frente para serem trilhados, para reerguer Angola para a posição que deve ser. Isto é, uma mudança que se tem de reconhecer antropologicamente complexa.”
 
Para terminar Luís Rodrigues afirmou que “a vida e a obra do Adolfo, expressa nos seus vários livros, e na intervenção política, é sem dúvida, um exemplo de fazer sempre com coerência, com independência, um sentido e um grande sentido de ação, um grande sentido prático de ação. Diria mesmo que o Adolfo às vezes, fora destes contextos mais literários, tem uma sagacidade de analisar a política que eu não encontro em muita gente, mesmo política nacional portuguesa. Uma capacidade de sintetizar, ir ao essencial, por de lado o que não é. Enfim, sabemos todos aprender aquilo que é lutar e lutar muito pela dignificação dos povos e, naturalmente, o de Angola em especial.” 
 
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Refletindo sobre o livro, o ativista Manuel dos Santos destacou que o título “Angola - A Hora da Mudança” transporta-nos para “uma realidade bastante entusiasmante, no meu ponto de vista, bastante interessante”, uma vez que para Angola “estar na hora da mudança é fundamental que se definam, entre todos nós angolanos, cá e lá, quais são as nossas responsabilidades no meio de tudo isso. Que se coloque também em primeiro lugar e, acima de tudo, principalmente para uma sociedade angolana que está profundamente partidarizada, mais com uma erosão quase que completa daquilo que é o sentido do político.”
 
“Infelizmente, a história desses 43 anos de independência de Angola é uma história profundamente hierarquizada, em que muitas dessas hierarquias são claramente uma herança colonial. E que, todos nós, temos plena consciência que a nossa independência se construiu dentro de um edifício colonial, com todos os vícios, com todos os elementos nocivos que isso possa representar na relação entre cidadãos que pretendem construir um país mais digno, mais humano, mais representativo e que, de facto, construa esse elemento fundamental que é o elemento da cidadania” acrescentando que a “obra de Adolfo Maria é de facto uma obra esclarecedora nesse sentido. É uma obra que interpela e interroga, porque eu acho que, mais do que fazer a análise da realidade angolana, o que o autor pretende, claramente é se interrogar e nos interrogar e nos levar a pensar criticamente tudo o que ele diz.”
 
Um segundo aspeto a salientar é que “o homem é a obra” para dar nota da vida do autor e de que a “sua obra é uma confirmação inequívoca e óbvia de que o que ele escreveu é a pensar no futuro”. 
Finalizou deixando um desafio ao autor…. “entre todas as figuras do nosso nacionalismo e da história política de Angola, há uma que é crucial mas profundamente ignorada, pouco estudada e com a incisão das pessoas da sua própria geração, quase ou nada se produziu sobre ele. E que é Gentil Viana, eu acho que o cota Adolfo é uma figura que, pela proximidade que teve com Gentil Viana, tem uma responsabilidade de permitir que esse grande “pensólogo” da política, da cultura, do movimento estudantil e da própria dimensão do nosso nacionalismo seja colocado num lugar que, historicamente, lhe é devido” acrescentando a importância da elaboração de uma “biografia sobre o Gentil Viana.”
 
O livro foi, também, apresentado pelo economista Eduardo Fernandes que destacou a personalidade de Adolfo Maria como “uma pessoa com uma capacidade de compreensão muito elevada. Eu diria mesmo, com o espírito magnânimo”. 
 
“Que livro é este que o autor Adolfo Maria acaba de publicar?“ questionou para de seguida afirmar que ao longo da obra “tornou-se claro que estava perante um conjunto de textos, coerentes entre si e apresentando um fio condutor que é a realidade angolana, na sua vertente histórica, da atualidade e até da projeção do seu devir. É sobre essa realidade que o autor se debruça e devo, desde já, dizer que, com muita e profunda capacidade analítica, “Angola - A Hora da Mudança” é um livro que nos interpela. A sua leitura obriga-nos à reflexão e eu diria que cada texto deste livro daria certamente uma boa conferência, uma boa mesa redonda, uma boa discussão. Porque não somos, não ficamos indiferentes, ao conteúdo destes mesmos textos.” 
 
“O livro tem 4 capítulos, 9 subcapítulos e 107 textos. E isto é obra. E tem uma cuidada edição, sempre cuidadosa, da Colibri. Trata-se de um livro cujo conteúdo não exige a leitura corrida, também tem as suas vantagens. Pode-se ler em qualquer momento, basta começar pelo índice e verificar qual o tema que mais lhe apetece ler naquele momento. Isto é extraordinário, eu chamaria, a este o livro do Adolfo Maria, um livro ótimo para a mesinha de cabeceira” confessou Eduardo Fernandes.  
 
Adolfo Maria começou a sua intervenção, pedindo um “minuto de silêncio de pé” pelas vítimas mortais da tragédia ocorrida em Moçambique. 
 
Para o autor o livro “Angola - A Hora da Mudança” enquadra-se no “meu objetivo de sempre, contribuir para o progresso de Angola. Daí os temas que aborda e, também, a maneira como são tratados. Visando explicitar bem as ideias, para que elas suscitem interesse, discussão e possibilidades de serem proveitosas” afirmando que é uma leitura “útil a todo e qualquer cidadão que queira compreender as várias situações de carácter político, económico, social, histórico, cultural” assim como encoraje o “debate sobre os temas que trata” uma vez que infelizmente em “Angola não há hábito do debate porque quer na luta pela independência, quer após a proclamação da independência, imperou o pensamento único”, afirmando que “o debate é essencial para encontrarmos as vias mais adequadas à resolução das dificuldades que Angola enfrenta”. 
 
Adolfo Maria finalizou destacando que “se este meu livro suscitar análise, reflexão e debate, ele cumprirá uma parte do seu objetivo e eu ficarei feliz. Até mesmo, vou morrer bem. O meu profundo obrigado a todos os presentes nesta sala, Angola merece que estejamos juntos para falar dela. Muito obrigado.”
 
 
 
Sinopse do livro “Angola - A Hora da Mudança”:
 
- textos de carácter socio-político, histórico e cultural sobre África e Angola;
- as análises sociopolíticas incidem particularmente sobre os últimos anos de exercício do poder de José Eduardo dos Santos e o novo ciclo inaugurado pelo presidente João Lourenço;
- entre muitos temas versados destacam-se as reflexões sobre: sociedade civil e seu empoderamento; intervenção cívica; democratização; construção do Estado e transparência da vida pública; poder local; elites dirigentes. 
 
 
Biografia de Adolfo Maria:  
 
Adolfo Maria, nascido em Luanda, entregou-se desde a sua juventude à luta nacionalista para a independência do seu país. Participou no combate cultural (Sociedade Cultural de Angola, jornal Cultura e Cine Clube de Luanda), nos anos 1950; no combate político (no PCA e no MLNA), o que lhe valeu a prisão pela polícia política portuguesa, a PIDE, em 1959; e no combate armado (nas fileiras do MPLA) nos anos 60 e 70 do passado século.  
Dentro da luta nacionalista, participou no combate pela democracia no seio do MPLA, em 1974, como membro da tendência Revolta Activa, o que originou um mandado de captura contra vários elementos dessa tendência, em Abril de 1976, cinco meses após a independência de Angola. Adolfo Maria escapou à rusga da polícia do regime, a DISA, e manteve-se escondido durante quase três anos, cessando a sua clandestinidade após o anúncio de amnistia pelo presidente da república; esteve ainda preso pela polícia política e, depois, foi expulso do país em 1979. Esse período que o autor viveu é descrito no seu livro ANGOLA, SONHO E PESADELO e a dramática vivência dessa clandestinidade é-nos transmitida na sua obra ANGOLA NO TEMPO DA DITADURA DEMOCRÁTICA REVOLUCIONÁRIA - POÉTICA DO AUTO-CÁRCERE.
No exílio, Adolfo Maria tem participado em colóquios, conferências, entrevistas e colaborado em publicações angolanas; é membro do painel do programa "Debate Africano" da RDP África. Além dos livros acima citados, publicou ANGOLA - CONTRIBUTOS À REFLEXÃO e os romances NAQUELE DIA NAQUELE CAZENGA e NA TERRA DOS TTR. Todas estas obras foram editadas por "Edições Colibri", em Lisboa.
 
 

 

Publicado em 28-03-2019